domingo, 30 de novembro de 2008

Promiscuidade



Sei-te longe, a passear do outro lado da rua.
Distante, tão distante. Sinto o teu cheiro.
A fugir, a correr a uma velocidade alucinante. Quase parada.
E berras o meu nome, insultas-me. Em silencio.
Cravas-me no peito essa lâmina intangível.
Levas-me para longe, um outro mundo. Sem sair do lugar.
Matas-me, envias-me para o desconhecido. Uma nova vida.
Abraças-me, sem que te sinta ou possa apertar.
Seguras a minha mão e sinto o vento lavar-me os dedos.
Olho-te... e vejo o horizonte.

Vazio. Este vazio. Familiar que se ausentou na tua presença.
Apagas-te-o e agora partiste. Ficando na cadeira ao lado.
Levaste-me todas as palavras.
E agora... agora não tenho imagens para dizer.

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Eu sei, eu sinto



E Ele castigou-me. E Ele puniu-me pelos meus actos.
E Ele condenou-me a para sempre viver enclausurado num de vós! Meros humanos.
(...)

E assim cheguei a vós, pelo castigo.
E assim começou a minha prisão eterna, pelo castigo.
E assim começou o meu ódio, pela dor.
E assim começou a minha revolta, pela dor.

Divino, sou um ser divino enclausurado num de vós. Sou um anjo de asas cortadas. Sou um Deus sem artes mágicas. Sou um Deus impotente.

Grande de mais para viver assim, vejo-me submetido a esta tortura. Vejo-me condenado às vossas limitações.
Eu devia ser livre. Eu devia voar. Eu devia entrar em combustão instantanea. Eu devia conseguir transformar àgua em vinho! Eu devia... saber o caminho das pedras.

E não sei. Por um qualquer acontecimento que não guardei na memória. Por qualquer coisa que um outro eu fez. Pelo que quer que tenha sido, sou forçado a fazer da agonia minha companheira. E deixá-la adormecer ao meu lado.
Qual erro o meu que me obriga a isto??

Eu devia amar e odiar simplesmente porque quero. Eu devia esquecer e lembrar quando quisesse. Eu devia ser capaz de viver qualquer sonho humano. Eu sinto que devia. Eu sei que devia!

Eu estou destinado a qualquer feito herculeano. A realizar qualquer coisa que num futuro desconhecido seria capaz de mover as massas!

Eu sei, eu sinto.

Sinto o peso do mundo nos ombros. Sei que na minha essencia seria capaz de fazer-vos sentir a minha mão, o meu consolo, o meu perdão.
E, muitas vezes, a minha ira!!

Sinto-me demasiado grande para o espaço que ocupo.
Sinto-me demasiado grande para as condições humanas.
Sinto que o meu destino é outro e estou somente a perder tempo.

sábado, 8 de novembro de 2008

Vozes



Estou amarrado pelos pulsos e pelas pernas. Preso a mim!
E eles vêem, a trajar todo aquele ferro, armaduras lustrosas. Com as espadas em riste, avançam para mim.
Um a um, cravam-me no peito punhais. Lentamente, vou morrendo.
Esvaio-me em sangue, escorre-se-me a vida dos olhos como areia dos dedos. Foge-me um ultimo suspiro, cansado, desisto. Paro de lutar.
Estes meus demónios interiores combatem-me como se eu fosse o seu Golias. E derrotam-me, rebaixam-me, humilham-me.
São incorpóreos, mas são vozes. São ecos silenciosos de murmúrios inaudíveis. São gritos ininterruptos.
Cansam-me, moldam-me. Matam-me.
Dão-me medo. E no medo, dão-me a vontade de não morrer.
Vivo suspenso. "Entre o mim e o que em mim".
Não vivo... sobrevivo.